Nesse período em que não podemos viajar, vamos trazer lugares e curiosidades especiais para vocês, através de entrevistas com as pessoas que trabalham e cuidam das atrações e lugares que tanto amamos.
Começamos com o Museu Marítimo Internacional de Hamburgo (IMMH – Internationales Maritimes Museum Hamburg), um museu imperdível para entender a história da navegação. Nosso entrevistado é o Damián. Ele é espanhol, mora em Hamburgo e é historiador do museu.

Cada andar do museu é chamado de Deck e assim aparecerá no texto. ?
Ficamos muito felizes de trabalhar novamente com vocês! Minha última matéria foi em 2016. O que mudou no museu desde então? (Em 2016, fizemos uma matéria sobre o museu, que está no Viagem Hamburgo)
Sim! Através das redes sociais vejo que há muito interesse, no Brasil e em Portugal, mesmo não tendo materiais que não sejam em inglês ou alemão. A maior mudança foi que avançamos muito nas traduções de textos dos materiais expostos para o inglês, era algo que faltava. São milhares de textos, alguns mais curtos, outros não, e desde o final de 2017 estamos traduzindo estes textos. Ou seja, o museu agora é mais bilíngue, mais acessível. E a mudança mais espetacular – que também está relacionada com Hamburgo e à América do Sul – é que desde 2019 começamos a receber o acervo histórico da Hamburg Süd. É mais de um século da história marítima de Hamburgo e da relação Hamburgo e América do Sul, pois a Hamburg Süd era a principal companhia que unia Hamburgo à América do Sul e até a Segunda Guerra Mundial, a Hamburg Süd também transportou passageiros. Há listas de passageiros, ainda incompletas, e que ainda não estão expostas, principalmente passageiros da América e Austrália.

Poderia nos falar um pouco sobre o museu e seu início?
O museu existe desde 2008 e busca explicar a história marítima da Humanidade. Sim, é da perspectiva de Hamburgo, mas sempre que falamos de navegação, torna-se um assunto internacional, e como os navios podem contar a história. A coleção, porém, começa em 1936, quando o fundador, Sr. Peter Tamm, aos 7 anos de idade, um dia doente em casa, recebe de sua mãe uma miniatura em escala 1:250 de um navio cargueiro de Hamburgo. Então ele começa a investir em mais miniaturas, e nessa coleção, de livros, objetos marítimos, pois queria ser almirante, algo que não aconteceu. O Sr. Tamm vinha de uma família tradicional de comerciantes do porto de Hamburgo. Era jornalista do Hamburger Abendblatt, especializado em temas relacionados à navegação – muito relevante para a cidade de Hamburgo – e chegou a ser diretor da casa editorial Axel Springer.

Aos 25 anos, adquire uma miniatura em escala 1:100, bem maior do que as pequenas que colecionava. Nos anos 80, se aposenta, com o que provavalmente era a maior coleção privada do mundo sobre navegação e passa a se dedicar somente a isto. A coleção é ampliada com mais miniaturas, barcos de verdade, selos postais, uniformes, documentos históricos. Somente na biblioteca, são mais de 500.000 volumes e de 50.000 planos originais de construção de navios. Em escala 1:1250, são cerca de 51 mil miniaturas! O Sr. Tamm falece em dezembro de 2016, mas dizemos que ele continua colecionando, pois o museu continua com a coleção em seu nome. E como a coleção virou museu?

Já nos anos 90, ele que era um homem influente, busca um local na cidade para transformar em museu a sua coleção privada, que até então ficava em uma mansão, como uma exposição, mas sem a estrutura de um museu. O prédio no qual o museu se localiza hoje é um armazém de 1869, o mais antigo de Hamburgo, que assim foi utilizado até o ano 2000 e estava vazio na época (início dos anos 2000). O edifício foi cedido à Fundação do Sr. Tamm, pois o prédio é parte do patrimônio histórico da cidade. E cerca de 7 anos depois, em 2008, o prédio do antigo armazém é inaugurado como o Museu Marítimo Internacional de Hamburgo. Hoje o diretor do museu é o seu filho, Peter Tamm.
O que os visitantes do Brasil podem encontrar no museu, que esteja relacionado ao país?
Temos navios brasileiros na seção das miniaturas, no Deck 9 do museu. Há um seção da marinha mercante, assim como da marinha militar, na qual o Brasil também está representado na coleção de uniformes e de medalhas militares, que está no 4º andar. Na época do incêndio do Museu Histórico Nacional Brasileiro, que foi uma tragédia, como um gesto de solidariedade a meus colegas, fiz uma série de posts sobre os nossos objetos do e da Marinha militar do Brasil. No 3º andar sobre a história construção naval há uma seção com os pequenos barcos e botes tradicionais de diversos povos e há uma jangada brasileira.

O museu tenta ter as marinhas de diversos países representadas e a Marinha brasileira está bem representada. Temos alguns objetos da Marinha Militar, como o florete. E mesmo quando não há um objeto específico do Brasil, há alguma relacionada, como um navio que carrega minérios do Brasil para a Europa, por exemplo. Isto que é que vemos na nova exposição do acervo da Hamburg Süd, da relação de Hamburgo com a América do Sul
A temática das marinhas militares, em especial da Segunda Guerra Mundial, é um tema que desperta muito interesse. O que considera um destaque deste tema no museu?
No Deck 5 temos a história das marinhas militares, desde a Idade Média às marinhas modernas, do século XIX até hoje. Neste andar, tratamos da história da Guerra Civil Americana, muito importante para a história dos Estados Unidos e para a história marítima do ponto de vista tecnológico. Avançamos então do século XIX para a Primeira e depois, Segunda Guerra Mundial. Temos algumas miniaturas que mostram a evolução tecnológica e da construção desses navios de guerra. Temos o modelo em escala 1:100 do navio Bismarck, ao lado do navio de guerra Yamato, da marinha imperial japonesa, que foi o maior navio de batalha já construído à época.

O tema da Segunda Guerra Mundial é tratado de forma exaustiva. Temos duas seções paralelas: uma dedicada à guerra submarina e outra dedicada à aviação naval, que são dois aspectos extremamente importantes na Segunda Guerra Mundial. Estas duas seções também completam o relato histórico e tecnológico das marinhas da Segunda Guerra Mundial. Ou seja, se o visitante quiser saber como evoluíram os navios de guerra no século XX, ficará feliz com o Deck 5 do museu.
A história dos navios de guerra no museu começa no século XIX ou tem, por exemplo, algo relacionado à Idade Clássica?

O que chamamos de Idade Clássica, ou “Age of Sail”, em inglês, sobretudo na Europa, entre os séculos XIV e XIX, é um tema que tratamos no Deck 2 do museu. Ali, falamos das primeiras potências navais, como Reino Unido, Portugal, Turquia e temos a exposição que termina com as Guerras Napoleônicas, com o busto do Almirante Horatio Nelson. Este andar (deck) do museu, é dedicado somente aos navios à vela. Temos também a história desde a Antiguidade, começamos com Mediterrâneo, depois os navios vikings, as caravelas, a China como potência marítima no século XIV.
Há algo sobre os emigrantes alemães no museu?
Agora com o acervo da Hamburg Süd, é uma parte importante no transporte de passageiros e também há listas com nomes. Essa nova seção irá incluir mais objetos da Hamburg Süd que mostram a relação estreita de Hamburgo com as Américas. As listas de passageiros não estão completas, mas se alguém tiver perguntas sobre antepassados, pode nos enviar por e-mail. Não podemos prometer, mas tentamos. Recebemos perguntas de pessoas sobre seus bisavós, por exemplo, que emigraram para as Américas nos navios da Hamburg Süd. A imigração é uma tema importante para entendermos a história da marinha mercante desde meados do século XIX. Muitas das grandes empresas marítimas de Hamburgo e do mundo começaram a fazer negócios com isto, pois havia milhões de emigrantes europeus que iam para a América. Tínhamos a Hamburg Süd para a costa leste da América Sul e a Hapag (hoje Hapag-Lloyd) na linha norte, assim como levavam passageiros, ao passarem pelo Chile, carregavam os navios com matérias-primas, principalmente fosfatos para a agricultura, e voltavam para a Europa.

Do novo acervo que está chegando, há dois modelos espetaculares, um de 1918 e um de 1927, já expostos no museu, que são os navios Cap Polonio e Cap Arcona no Deck 6. Eram navios de passageiros da Hamburg Süd e estes modelos originais eram usados pela empresa para fazer publicidade. O navio Cap Arcona tem uma história sombria, porque ele levou presos do campo de concentração de Neuengamme (próximo a Hamburgo) em 1945 e foi sinalizado como transporte de tropas. Então, foi bombardeado pela aviação inglesa e somente neste navio morreram cerca de 5 mil pessoas. Mas originalmente, o navio era um Ocean Liner super luxuoso que fazia o trajeto Europa (Hamburgo) e América do Sul, com parada nos portos brasileiros. O modelo do Cap Arcona foi feito em escala 1:37,5 e tem mais de 5 metros. É um objeto carregado de história e visualmente espetacular.
Quais são os ítens que mais despertam interesse nos visitantes de outros países? Para você, qual é o ponto alto do museu, que o visitante não pode deixar de ver?

Há várias coisas. Os highlights são algo muito subjetivo, mas do meu ponto de vista, os ítens mais espetaculares do museu são os barcos de ossos, feitos por prisioneiros de guerra. É uma coleção única no mundo. São 33 miniaturas de navios contruídas por prisioneiros de guerra durante as Guerras Napoleônicas, com os ossos dos restos de comida. Duas vezes por semana, eles tinham refeições com carne, ou seja, não são ossos humanos, mas dos animais que restavam. Calcula-se que existam 650 miniaturas como esta no mundo e 33 delas estão aqui no museu. É a maior coleção aberta ao público destas miniaturas no mundo.

Um dos objetos mais divertidos é a réplica do navio de passageiros Queen Mary II feita de Lego, em escala 1:50. É um réplica do navio que está na doca 17 da empresa Blohm + Voss no porto de Hamburgo. Todos ficam fascinados por esse modelo enorme de Lego, sejam idosos ou crianças. É algo divertido e muito bonito.
Temos também uma coleção maravilhosa de pinturas marítimas, do século XVII ao século XX, mas principalmente do século XIX. Temos dioramas espetaculares, como o da reconstrução de uma parte do porto de Hamburgo em escala 1:1250 com os navios, no qual se pode ver como funcionam os diferentes setores comerciais de um porto. A miniatura do navio Cap Arcona também.

Qual outro museu, cidade, ou atração turística na Alemanha você recomenda que aos visitantes?
Quem vem a Hamburgo, recomendo que visite o navio-museu Cap San Diego. Era um navio dos anos 70 da Hamburg Süd, que está no porto de Hamburgo. É uma maravilha. Creio que quem visita Hamburgo também deveria ir ao Memorial do Campo de Concentração de Neuengamme. É extremamente interessante, e as pessoas que trabalham no Memorial fazem um excelente trabalho explicando a parte mais sombria da história de Hamburgo, da Alemanha e também da Humanidade. Hum..e algo que não seja museu…Sim, algo que recomendaria aos visitantes de Hamburgo que queiram sair à noite, é não irem à Reeperbahn. Vá aos bares mais autênticos do bairro de St. Pauli. A bebida é mais barata, o ambiente é mais autêntico e há menos turistas, pois a Reeperbahn virou uma espécie de Disneylândia do turismo adulto. Vá um pouco mais para o norte de St. Pauli, no Karoviertel, ou ao sul da Reeperbahn, perto do porto.
P.S. Nossa conversa foi por telefone, no final de abril de 2020, e traduzida e transcrita por mim.
Queremos agradecer mais uma vez, ao Damián e à equipe do IMMH pela entrevista e pelo material gentilmente cedido para o nosso post.
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